António, de alcunha o Gato, devido aos seus olhos azuis, para além da obrigação de zelar pelo granjeio das vinhas e olivais espalhados pela freguesia, adorava o seu violino e a caça. Não morria de amores pelas tabernas nem por futebóis . Religioso, ia à missa aos domingos e dias santos, abstinha-se de carne na semana santa, mesmo pagando a bula e rezava o terço à noite, com a mulher e seus quatro filhos, ainda rapazes. A oração do terço era cantarolada alternadamente pelo pai e restantes membros da família, num dialogo quase musical, repetitivo e transmitido de pais para filhos. Naqueles momentos passava-se do rebuliço do dia à calma, da traquinice ao sossego, tornando-se um momento de comunhão e ao mesmo tempo de entrada na escuridão, atenuada pela luz trémula duma candeia de azeite. Por isso, o trautear do terço convidava, logo de início, a um deixar-se levar nos braços da noite. Resistir-lhe era quase impossível. Assim, a maioria das vezes, lutar contra o sono era uma guerr...
..Sem grandes pretensões e descuidado quanto baste.